Prótese total implanto-suportada para a maxila: considerações clínicas
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- Categoria: Artigos Científicos
- Escrito por Mateus Bertolini Fernandes dos Santos - Fernando Luiz Brunetti Montenegro - Jarbas Francisco Fernandes dos Santos - Rafael Leonardo Xediek Consani
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Clinical tips: full maxillary prosthesis supported by implants.
“Como publicado na Revista Paulista de Odontologia Out-Dez 2009, 31(4):9-13 “
Resumo
A procura por tratamentos reabilitadores com implantes vem crescendo continuamente, visto que as próteses convencionais, principalmente nos casos onde a perda de elementos dentais é maior, não são adequadas quanto a alguns aspectos, como retenção e estabilidade. Fato este que diminui a capacidade mastigatória do paciente, influenciando também o seu convívio social, no qual a falta de retenção das próteses leva os pacientes a não se sentirem seguros para conversar com outras pessoas. Neste trabalho, é relatado um caso de reabilitação com prótese do tipo protocolo sobre seis implantes na maxila, em substituição a uma prótese total mucosuportada, aprimorando aspectos relacionados à estética e função. Porém, ressalta-se a importância de explicar ao paciente as limitações deste tipo de reabilitação para que não haja desgastes posteriores no relacionamento com o profissional.
Descritores: Implantes Dentários, Prótese Dentária,Reabilitação Bucal
Introdução e Revisão da Literatura
As próteses do tipo protocolo surgiram com o intuito de devolver a função para pacientes que não conseguiam se adaptar às próteses totais convencionais, principalmente aquelas colocadas em mandíbulas severamente reabsorvidas. Estes pacientes foram então chamados de inválidos orais1. Este tipo de prótese consistia na colocação de quatro a seis implantes na região anterior da mandíbula (entre os foramens mentonianos) os quais, após um período de espera de quatro a seis meses, passavam a sustentar uma prótese fixa com infra-estrutura metálica e dentes em resina acrílica. Com o passar do tempo esse tipo de tratamento foi evoluindo, passando a ser realizado em ambos arcos dentais e em alguns casos até com carga imediata.
Atualmente as próteses convencionais vêm sendo preteridas pelos pacientes, devido a diminuição no custo dos implantes dentários, os quais por sua vez proporcionam um grau de conforto muito maior para o paciente2, bem como um alto índice sucesso em longo prazo3, 4.
Dessa forma as próteses sobre implante assumiram um papel importante na Odontologia no que tange os aspectos relacionados à estética, função5 e equilíbrio das estruturas do sistema estomatognático6.
Assim apresentam-se como a melhor forma de reabilitação para a maioria dos casos de pacientes desdentados totais7, apresentando-se como uma forma viável de tratamento que proporciona retenção e estabilidade ao aparelho, permitindo um aumento na eficiência mastigatória, além de um aumento da auto-estima do paciente8.
No entanto, as próteses implanto-suportadas que envolvem a região anterior do arco maxilar apresentam em diversas ocasiões severas restrições para a obtenção de estética ótima. Embora apresente grandes contribuições no aspecto funcional, a inadequação a um padrão estético elevado pode ser fonte de queixas e quebra da relação de confiança entre o paciente e o profissional, trazendo conseqüências nefastas para o sucesso da terapia9, 10. Deste modo, é imprescindível que o profissional chame a atenção do paciente para as limitações da terapia, evitando expectativas irreais.
Relato do Caso Clínico
O paciente do sexo masculino com 50 anos de idade, parcialmente dentado fazia uso de prótese parcial removível convencional e apresentou-se na clínica odontológica com queixas quanto à estética, retenção e função que a mesma apresentava. Após exame clínico e anamnese adequados, foi requisitada ao paciente a realização de radiografia panorâmica para auxílio no planejamento da reabilitação. De posse da radiografia e de modelos anatômicos obtidos à partir de moldes em alginato, foi sugerido ao paciente a colocação de seis implantes distribuídos pela região desdentada
(Figura 1)

e confecção de protocolo superior sobre estes implantes; que foi prontamente aceito pelo paciente, o paciente consentiu ainda com a divulgação do caso por meio de artigo científico.
Após um tempo de espera de seis meses referentes ao período de osseointegração dos implantes ao osso adjacente, foi realizada cirurgia de reabertura e colocação de cicatrizadores nos implantes. Duas semanas depois (Figura 2)

foi realizada uma moldagem de transferência com moldeira fechada e envio ao laboratório para confecção de moldeira aberta individual. Na sessão seguinte, os transferentes para moldeira aberta foram parafusados e unidos entre si com resina acrílica de baixa distorção
(Figura 3)

, a moldagem foi realizada com silicona polimerizada por reação de condensação leve em moldeira individual feita em resina acrílica com abertura nas regiões onde se apresentavam os implantes, após a polimerização da silicona os transferentes foram desparafusados e o molde removido da boca
(Figura 4).

A partir desta moldagem foi obtido modelo em gesso pedra especial tipo IV, sobre o qual foi confeccionada uma base de prova para tomada da dimensão vertical e registro da relação maxilo-mandibular mediante a utilização de um plano de cera superior
(Figura 5)

Os modelos foram então montados em articulador semi-ajustável na posição de relação central, e realizada a seleção de cor e tamanho dos dentes artificiais. A partir da dimensão vertical aferida foi realizada em laboratório a montagem dos dentes artificiais, seguida de prova estética e funcional no paciente
(Figura 6)

A realização desta montagem dos modelos em articulador e prova dos dentes antes da confecção da infra-estrutura metálica é de extrema importância pois desta forma tanto o técnico de laboratório quanto o cirurgião-dentista podem ter uma noção do espaço que será necessário para a realização da mesma, evitando assim imprevistos posteriores, otimizando a resistência mecânica dentro das limitações impostas pelo posicionamento dos dentes ditado pela estética anterior.
Após a prova estética e funcional dos dentes artificiais terem sido aprovadas pelo paciente, e do caso apresentar-se favoravelmente em relação ao espaço para a realização da prótese, foi confeccionada a barra metálica fundida
(Figura 7)

A barra foi provada no paciente atentando-se ao fato da necessidade de passividade da barra quando em posição, passividade esta que permitirá que os esforços durante o uso contínuo da prótese possam ser distribuídos por todos os implantes sem que haja sobrecarga em nenhum em especial, fato este que poderia acarretar na fratura de parafusos ou mesmo do implante
(Figura 8)

A adaptação da barra foi também conferida por meio de radiografias periapicais. Note-se que a barra possui retenções para cada dente individualmente, para evitar percolações, sem comprometer a estética.
Com a aprovação clínica da barra, foi realizado o posicionamento dos dentes sobre a mesma, na mesma posição em que foram previamente montados na base de prova. Este posicionamento foi conferido em boca e aprovado. A prótese foi então foi polimerizada, recebeu acabamento e polimento
(Figura 9)

, e instalada no paciente
(Figura 10)

A região cervical do protocolo, que terá contato com a mucosa do paciente é inteiramente em metal polido, dificultando a colonização bacteriana (se comparado à resina acrílica) e facilitando deste modo a higiene.
O paciente mostrou-se satisfeito com o tratamento realizado, sendo reportado pelo mesmo uma melhora em sua auto-estima, que pode ser justificada pelo aumento da eficiência mastigatória, melhora no convívio social pelo fato da prótese apresentar-se fixa na boca e pela estética alcançada após o tratamento (Figura 11)

Após a instalação da prótese o paciente foi informado da necessidade de extrema atenção com a higiene, sendo recomendada a utilização de passa fios e escovas inter-dentais para a limpeza da região entre implantes, bem como a necessidade de realização de visitas periódicas ao consultório para limpeza profissional.
Discussão
Durante o planejamento de reabilitações extensas em próteses sobre implante, o profissional se depara com uma gama de possibilidades de tratamentos, e assim deve ponderar alguns aspectos, técnicos e clínicos, como número e posicionamento dos implantes, espaço necessário para a reabilitação e indicação dos materiais11; para escolher o que seria a melhor forma de tratamento para determinado caso. A reabilitação com carga imediata é uma realidade, mas não é indicada para todos os casos, e o profissional deve levar em conta as contra-indicações e fatores de risco desta técnica, tais como hábitos parafuncionais, diabetes, etilismo, tabagismo, higiene bucal desfavorável, não obtenção de estabilidade primária do implante, osso com qualidade desfavorável, entre outros12.
Dentre os fatores que contribuem para o sucesso do tratamento protético e que tem grande importância na reabilitação sobre vários implantes, como nesse caso, é a passividade. O assentamento passivo pode ser definido como o menor desajuste marginal possível5, resultando em uma estrutura protética que sob a ação das forças mastigatórias não provoca tensões excessivas nos implantes, e que a longo prazo contribuirá para o sucesso da reabilitação protética13, porém, sua ausência a partir de desajustes marginais superiores à 150μm14 podem promover complicações de ordem mecânica e biológica15.
As próteses sobre implantes geram grande expectativa em relação ao resultado final16, sendo necessário que o profissional explique as limitações que este tratamento apresenta para que esta expectativa seja congruente com a realidade17, minimizando a possibilidade de decepções e aumentando a confiança do paciente para com o profissional18.
Estudos longitudinais relatam um alto percentual de sucesso obtido com próteses do tipo protocolo (98,6%)4, sendo relatado pelos pacientes uma melhora significativa na sua qualidade de vida e uma maior satisfação com a prótese8.
No caso que ora se apresenta, pode ser observada na figura 10, sobre os dentes 12 e 13, na região cervical, a tentativa de fechamento com resina acrílica quimicamente ativada dos orifícios de entrada dos parafusos de fixação, os quais ficaram em posição indesejável devido ao posicionamento dos implantes. Estes, por sua vez, tiveram sua posição inadequada devido ao restrito leito ósseo. Embora pouco perceptíveis no sorriso (figura 11), podem comprometer o sucesso em pacientes mais exigentes quanto ao quesito estético. A utilização de mini abutments pode auxiliar na obtenção de um posicionamento mais favorável dos parafusos de fixação, embora seu uso seja restrito devido ao posicionamento dos dentes, em casos maxilares. Assim, o esclarecimento deste tipo de limitação é mandatório, para prevenir problemas que afetem a relação paciente profissional9, 10.
Considerações Finais
Embora as próteses do tipo protocolo apresentem-se nos dias atuais como uma modalidade terapêutica que tem mostrado alto nível de sucesso, em função do conforto e segurança que o paciente adquire, é fundamental que suas limitações sejam apresentadas de modo claro aos pacientes antes de sua confecção, para prevenir expectativas irreais e conseqüentes frustrações.
Mateus Bertolini Fernandes dos Santos-Mestrando em Prótese Dental – FOP-UNICAMP
Fernando Luiz Brunetti Montenegro-Mestre e Doutor FOUSP,Cursos Espec Odontogeriatria
Jarbas Francisco Fernandes dos Santos-Professor de Prótese Dentária UNIVAP e UNITAU
Rafael Leonardo Xediek Consani-Prof Adjunto Depto Prótese e Periodontia – FOP-UNICAMP
Leonardo Marchini-Professor de Prótese Dentária UNIVAP e UNITAU
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